14 novembro 2009

Caso Freeport à beira do encerramento

Escreve o Público na sua edição de hoje:

«As investigações no âmbito do processo Freeport que já foram encerradas pelas autoridades britânicas estão também a terminar em Portugal, disse ao PÚBLICO o procurador-geral da República. O relatório final sobre o processo já começou a ser elaborado pelos investigadores do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e, no máximo, até ao princípio do próximo ano deverá existir uma decisão sobre o caso: arquivamento ou acusação.
Por falta de indícios suficientes para avançar com uma acusação, os ingleses decidiram dar por findo o processo autónomo que abriram, há dois anos, em Inglaterra. Precisamente por se tratar de uma investigação autónoma, esta decisão não condiciona o processo português que envolve o nome do primeiro-ministro, no âmbito do qual têm ainda de ser realizadas algumas diligências.
Segundo a principal responsável pela investigação, a procuradora-geral adjunta e directora do DCIAP, Cândida Almeida, um dos principais motivos que explicam a lentidão deste processo de suspeita de corrupção no licenciamento do Freeport, que se arrasta há cinco anos, é a complexidade relacionada com a identificação dos percursos dos fluxos financeiros pertencentes ao complexo comercial em Alcochete. As diligências que faltam em Portugal estão precisamente ligadas ao esclarecimento sobre esses movimentos financeiros, motivo que já levou, por diversas vezes, os inspectores da Polícia Judiciária de Setúbal e os procuradores do Ministério Público a Londres. Os procuradores titulares deste processo, Paes de Faria e Vítor Magalhães, aguardam ainda elementos sobre a circulação do dinheiro, que foram solicitados às autoridades britânicas.O encerramento do processo em Inglaterra foi decidido pelo Serious Fraud Office (SFO) e pela Overseas Anti-Corruption Unit que, num comunicado divulgado ontem, informa que a investigação, apoiada pela Polícia de Londres, "foi encerrada". No mesmo comunicado, a SFO compromete-se, no entanto, "a continuar a dar assistência que for requerida pelas autoridades portuguesas através de assistência legal mútua".
Foi a primeira vez que esta agência governamental britânica, que investiga os casos de fraudes financeiras complexas, se referiu publicamente ao caso Freeport. O principal arguido do processo, Charles Smith, que esteve envolvido no licenciamento do Freeport, terá já sido informado de que a sua inquirição marcada para Dezembro em Londres foi cancelada. Além de Smith, estavam a ser investigados pelo SFO, Sean Collidge, ex-presidente do grupo Freeport, os antigos administradores Gary Russell, Jonathan Rawnsley e Rick Dattani e o consultor William Mckinney Junior. Não foram reunidos elementos suficientes para os incriminar neste processo. Em Portugal, são arguidos, além de Charles Smith, Carlos Guerra (ex-presidente do Instituto da Conservação da Natureza), José Dias Inocêncio (antigo presidente da Câmara de Alcochete), José Manuel Marques (antigo assessor da autarquia), Manuel Pedro (sócio de Charles Smith na empresa Smith & Pedro) e Eduardo Capinha Lopes (responsável pelo projecto de arquitectura).
Paralelamente, terminaram também já as inquirições no âmbito do processo disciplinar ao presidente do Eurojust (organismo europeu de cooperação judiciária), Lopes da Mota, acusado de pressionar os procuradores do processo para o arquivar.
É o desfecho natural de um processo que tem uma marca essencialmente política e que, portanto, cumpriu a sua função, que mais não foi do que introduzir elementos novos (perturbadores), que são vantajosos para uns e prejudiciais para outros, no debate político, ou melhor, na luta pelo poder.
É por demais óbvio que as autoridades policiais sabem hoje tudo sobre o percurso dos dinheiros, ou não tenham as policias um elevadíssimo nível de perfeição quando se trata de apurar coisas importantes. Só que o que move estes processos não é, por regra, o interesse na descoberta da verdade, visando uma incriminação, mas o ajuste das pedras no jogo do poder.
Aquilo que é crime, quando o arguido é um cidadão vulgar, deixa de o ser - às vezes até é virtude - quando se lida com um agente político ou económico de peso, jogando-se noutro tabuleiro com outras contrapartidas.
Tudo isto teve o seu auge, afinal, quando os homens da CIA compraram o outlet e apareceram, como ingénuos, a dizer que faltava dinheiro. Por acaso, o governo até mudou de opinião relativamente à localização do aeroporto, depois de se ter dado como certo que ele seria na Ota e não em Alcochete.
Faltam muitas peças para compor o puzzle.
Mas este jogo é outro, claramente.

1 comentário:

Duarte Nuno disse...

Meu caro Miguel Reis
A clareza e qualidade dos textos publicados no Blog são de enorme importância, em contraste com declarações de penalias promovidos pela comunicação social, em especialistas nestas matérias, que mais tarde se verifica corresponderem a orientações partidárias.