Uma barata tonta (1)
Três antigos bastonários da Ordem dos Advogados
ligados ao negócio das arbitragens (essa justiça privada e clandestina tão
zelosamente promovida pelo actual governo) vieram atacar-me pessoalmente por eu
ter criticado a ministra da justiça no programa da SIC «Conversas Improváveis»,
onde dissera que ela é uma barata tonta e uma pessoa traiçoeira em quem não se
pode confiar.
António Pires de Lima, que já não se lembra dos
insultos que dirigira a António Guterres, José Sócrates, Alberto Costa e
Alberto Martins, veio dizer ao semanário Sol que eu devia «andar a puxar uma
carroça em Lisboa». Ele, que há uns anos comparou o Ministério Público à
Gestapo de Hitler e à PIDE de Salazar e que antes do 25 de Abril fora advogado
de uma das mais ferozes forças de repressão da ditadura, defendeu a actual
ministra afirmando que ela «tem feito o possível, o que não pode é fazer
milagres». Confessou ainda «ter a maior consideração» por ela e desejou-lhe
«boa sorte». Ámen!
Júlio Castro Caldas, sócio do chefe de gabinete
da ministra, veio também a público afirmar que ela fora alvo de uma «pública
injúria com intenção de ofender» - um acto para o qual nem «o histrionismo de
carácter, estimulado pelo talk-show, é atenuação suficiente». Castro Caldas tem
motivos para vir em socorro da ministra, pois, além de interesses comuns nas
arbitragens, foi nomeado por ela para a Comissão de Revisão do Código de
Processo Civil. Também tem motivos para me atacar dessa forma descabelada pois,
em tempos, escrevi um artigo sobre um bastonário da OA que fora alvo de uma
participação de um juiz por se ter descoberto em plena audiência de julgamento
que na véspera ele tinha reunido com as testemunhas do seu cliente, suspeitando
o juiz e o advogado da parte contrária que essa reunião fora para as
industriar. Claro que Castro Caldas foi absolvido pelo conselho Superior da OA,
quando Júdice era bastonário, pois, em regra, esse tipo de comportamento só
constituía infracção disciplinar quando visava advogados mais modestos, de
preferência da província.
José Miguel Júdice que, enquanto bastonário da
OA, tentava, entre outros negócios, vender submarinos ao governo, veio rasgar
as vestes em público, dizendo que eu ultrapassei «todos os limiares da boa
educação» por ter feito as declarações que fiz «contra uma senhora que está a
desempenhar o seu papel da melhor maneira que pode e sabe». Refira-se que
Júdice aumentou e muito a sua fama de «bem educado» pela forma elevada como em
tempos tratou o bastonário Rogério Alves, o presidente do Conselho Superior,
Luís Laureano Santos e o seu vogal, Alberto Jorge Silva, por lhe terem
instaurado um processo disciplinar por, em declarações públicas, exigir que o
estado consultasse sempre a sua sociedade de advogados. Também contribuiu para
a sua láurea de boa educação, a forma elegante como passou a referir-se a outra
«senhora», a antiga ministra da justiça Celeste Cardona, depois de o então
ministro da defesa, Paulo Portas, ter preterido o cliente do escritório de
Júdice na compra dos tais submarinos.
Júdice, que se demitiu do PSD para ir ganhar
dinheiro com José Sócrates e António Costa (de quem foi mandatário à Câmara de
Lisboa) quando Luís Marques Mendes era presidente do partido, terá agora de
fazer muitos mais exorcismos públicos como este para voltar a estar em
condições de facturar como na altura em que Durão Barroso e Santana Lopes
chefiaram o governo. Recorde-se que, nesse tempo, o escritório de Júdice
recebia, só de uma empresa pública, dois milhões de euros por mês (um milhão em
cada 15 dias), supostamente, por assessoria jurídica. Por outro lado, a sua boa
formação está lapidarmente evidenciada numa entrevista ao JN, em que,
pronunciando-se sobre a Zona Ribeirinha do Tejo, para cuja administração José
Sócrates acabava de o nomear presidente, disse: «Aí sinto-me um ginecologista.
Trabalho onde espero que muitos se divirtam».
Enfim, são três antigos bastonários que, por
inconfessados interesses pessoais, não hesitam em atacar publicamente o
bastonário da OA em exercício, unicamente para cair nas boas graças do poder
político. Estranha noção de dignidade, a deles.
António Marinho e Pinto
Sem comentários:
Enviar um comentário