16 julho 2008

Fazer a folha ao Marinho ou... ter coragem para esclarecer tudo

O Correio da Manhã publicou a seguinte notícia:

«O Conselho Superior da Ordem dos Advogados decidiu solicitar ao bastonário, Marinho Pinto, que concretize as denúncias que tem vindo a fazer a vários órgãos da instituição. Quem já avançou com uma participação disciplinar contra obastonário foi o presidente da Distrital de Faro.
"Os conselhos distritais sentem-se ofendidos porque, contrariamente ao senhor bastonário, trabalham sem qualquer remuneração e são acusados de gastar o dinheiro da Ordem" - disse ao CM o dirigente António Cabrita.
O advogado algarvio confirmou que comunicou ao Conselho Superior ter tido conhecimento de que Marinho Pinto estará envolvido como advogado num processo que está a decorrer em Lagos, apesar de ser remunerado para exercer o cargo de bastonário em exclusividade.
"O regime de exclusividade pressupõe que não se exerça outra actividade", explicou AntónioCabrita, garantindo ainda que, ao contrário do que afirmou Marinho, o conselho a que preside "não lucra com a formação": "Até temos prejuízos. E eu não admito a ninguém que ponha em causa a minha honra e a dos meus colegas."
Em carta dirigida aos advogados, porém, o bastonário reafirma que "a formação é um bom negócio dentro da Ordem" e que "há muita gente que ganha dinheiro".
A contestação ao bastonário Marinho Pinto, apenas sete meses depois de ter sido eleito, está a causar tensão entre os advogados, que têm dirigido várias cartas à Ordem. Tal como o CM já noticiou, pelo menos em duas missivas, a que o CM teve acesso, os causídicos apelam à realização de uma assembleia extraordinária, o que depende da recolha de 2600 assinaturas.
A situação, inédita, acabou por estar na origem de uma reunião de emergência do Conselho Superior, que ontem decidiu por unanimidade pedir explicações ao bastonário.»
Marinho Pinto mexeu com grandes interesses e começou o movimento para lhe «fazerem a folha».
Os jornais noticiaram que o Conselho Superior da Ordem reuniu na 2ª feira à noite.
Não há nenhum comunicado no site da Ordem e nem se compreende bem para que foi a reunião.
Nos termos do Estatuto da Ordem dos Advogados, a competência do Conselho Superior é a que consta das seguintes normas:
Artigo 43.º Competência
1 - Compete ao Conselho Superior, reunido em sessão plenária:
a) Julgar os recursos interpostos das decisões das secções referidas nas alíneas b) e e) do n.º 3;
b) Julgar os recursos das deliberações do Conselho Geral, dos conselhos distritais, e dos conselhos de deontologia;
c) Julgar os processos disciplinares em que sejam arguidos o Bastonário, antigos Bastonários e membros actuais do Conselho Superior ou do Conselho Geral;
d) Deliberar sobre pedidos de escusa, de renúncia e de suspensão temporária de cargo, nos termos dos artigos 15.º e 16.º, e julgar os recursos das decisões dos órgãos da Ordem dos Advogados que determinarem a perda de cargo de qualquer dos seus membros ou declararem a verificação de impedimento para o seu exercício;
e) Deliberar sobre impedimentos e perda do cargo dos seus membros e suspendê-los preventivamente, em caso de falta disciplinar, no decurso do respectivo processo;
f) Fixar a data das eleições para os diversos órgãos da Ordem dos Advogados, quando tal não seja da competência do Bastonário;
g) Convocar assembleias gerais e assembleias distritais, quando tenha sido excedido o prazo para a respectiva convocação;
h) Elaborar e aprovar o seu próprio regulamento;
i) Elaborar e aprovar o regulamento dos laudos sobre honorários;
j) Elaborar e aprovar o regulamento disciplinar;
l) Uniformizar a actuação dos conselhos de deontologia.
2 - Compete ao Conselho Superior e ao Conselho Geral, em reunião conjunta:
a) Julgar os recursos das deliberações sobre perda do cargo e exoneração dos membros do Conselho Superior e do Conselho Geral;
b) Deliberar sobre a renúncia ao cargo de Bastonário;
c) Deliberar sobre os conflitos de competências entre órgãos nacionais e distritais e uniformizar a actuação dos mesmos.
3 - Compete às secções do Conselho Superior:
a) Julgar os recursos das deliberações, em matéria disciplinar, dos conselhos de deontologia; b Ratificar as penas de expulsão;
c) Instruir os processos em que sejam arguidos o Bastonário, antigos Bastonários e os membros actuais do Conselho Superior e do Conselho Geral;
d) Instruir e julgar, em 1.ª instância, os processos em que sejam arguidos os antigos membros do Conselho Superior ou do Conselho Geral e os antigos ou actuais membros dos conselhos distritais e dos conselhos de deontologia;
e) Dar laudo sobre honorários, quando solicitado pelos tribunais, pelos outros conselhos ou, em relação às respectivas contas, por qualquer advogado ou seu representante ou qualquer consulente ou constituinte.
Não se percebe muito bem para que é que reuniram os do Conselho Superior.
Há algum processo que eles tenham que apreciar ou o Conselho quer deixar de ser um órgão de julgamento para ser uma polícia?
O pouco prestígio que a Ordem já tem perder-se-à completamente se o Conselho Superior deixar de ser uma alta instância para se transformar numa polícia da instituição.
Neste momento, o País sente que querem calar Marinho Pinto e que lhe querem fazer a folha.
Todos sabemos que são incómodas as coisas que ele diz. Mas só há um caminho para responder a essa incomodidade que é o do esclarecimento até ao último detalhe.
Poderá ser o fim da Ordem - que eu, aliás, defendo mas por outras razões e noutras circunstâncias - se se instaurar uma espécie de estado de sítio, fazendo a folha ao Bastonário ou obrigando-o a calar-se.
Se isso acontecer será uma vitória de Pirro, que colocará a Ordem no lixo da História.
O que é importante é esclarecer tudo...
É mentira que há uma negociata na formação?
Como foram contratados os formadores? De que escritórios são? Quanto ganham em formação e quanto ganham como advogados? É ou não é verdade que nenhum formador foi escolhido por concurso? É ou não é verdade que os formadores foram convidados por conhecimento pessoal de alguém dos órgãos dirigentes? Qual o perfil profissional de cada um dos formadores? Em que processos tiveram intervenção? Quantos ganharam e quantos perderam?
E mais, no mesmo jeito, relativamente a cada uma das afirmações feitas no relatório do bastonário.
Indispensável é que se exija do Bastonário que ele publique a lista de todos os advogados que têm sido pagos pela Ordem, com os valores pagos a cada um. Como é indispensável que haja contas das conferências e que seja esclarecido se foram pagos os impostos ou se houve sonegação fiscal.
O relatório de Marinho Pinto não pode ser recebido como o relatório de um louco nem desvalorizado como o foram, de forma desprezivel e displecente, as suas declarações, nomeadamente pelo comunicado do Conselho Superior da Magistratura.
Esse é outro órgão que deveria fechar, porque não faz nenhum sentido.
Uma coisa é a independência dos juizes, que é intrinseca à sua consciência. Outra, bem diferente, é a gestão do aparelho judicial em que eles se integram. Essa deveria ser feita pelo Ministério da Justiça, em função de critérios de avaliação rigorosos, processados por entidades externas.
Não faz nenhum sentido que uma classe se avalie a si própria, neste tempo em que as ciências da gestão e da organização padronizaram métodos e em que os direitos dos cidadãos têm parâmetros que são espezinhados todos os dias.
Ninguém pode nem deve tocar na consciência de um juiz.
Ninguém pode nem deve pretender que haja buracos que permitam ofender o princípio do juiz natural. Felizmente que os programas informáticos são mais fiáveis do que as pessoas e impede hoje as poucas vergonhas que antes eram possíveis (mas apenas na distribuição...).
Faz algum sentido que as inspecções dos juizes sejam feitas por juizes? Não seria preferivel que fossem feitas por auditores independentes?
Ninguém pode pretender que um juiz decida os volumes de processos que alguns têm.
Mas isso não é desculpa para que o Estado, por eles, ofenda as mais elementares regras de serviço público e faça esperar pessoas para julgamentos que não se fazem ou não respeite os prazos que, draconianamente, impõe aos particulares.
Não há nenhuma explicação para que uma parte pague a multa que tem que pagar no 1º, 2º ou 3º dia de atraso na entrega de um peça processual e o Estado não tenha que pagar, a mesma multa, se o mesmo tipo de falta é cometido pelo agente do orgão de soberania tribunal.
Claro que tudo isto é incómodo... E é transversal porque cortas as próprias classes pelo meio.
Há advogados e advogados; há juizes e juizes.
O grande problema - e a grande virtude - é que tanto os advogados como os magistrados estão partidos aos meio. Não têm é a coragem de o assumir.

1 comentário:

Anónimo disse...

Será desses formadores que Marinho fala? Duvido muito. Alias, veja-se como a formação se tornou negocio no CDL e de que formadores se fala....Miguel Reis esta a ver o lado errado...